Venda de assentos individuais por empresas de táxi aéreo: de onde viemos, onde estamos e para onde vamos

Demorou um pouco, mas o mercado finalmente descobriu a venda de assentos individuais por empresas de táxi aéreo
Link para a matéria do Valor Econômico de 03/10/2022

Em 04 de agosto de 2020, no auge da primeira onda da pandemia da Covid 19, a ANAC publicou a Res. Nº576, que teve por objetivo “estabelecer o alcance dos requisitos aplicáveis às empresas aéreas que conduzem operações agendadas no âmbito do Regulamento Brasileiro da Aviação Civil – RBAC nº 135” – ou, em outras palavras, permitir que as empresas de táxi aéreo, antes limitadas à comercialização de fretamentos integrais de suas aeronaves, também pudessem realizar a venda de assentos individuais, desde que em volume igual ou inferior a 15 operações por semana. Na prática, a medida possibilitou que as empresas de táxi aéreo pudessem operar como micro-linhas aéreas, em uma modalidade que fora desempenhada previamente pelas operações de LAS (Linhas Aéreas Sistemáticas), implementadas pelo antigo DAC por meio da IAC 202-1001 – porém, agora com muito mais flexibilidade e menos burocracia.

Quando, em abril de 2020, a ABAG – Associação Brasileira de Aviação Geral solicitou à ANAC a redação de um instrumento regulatório que permitisse a venda de assentos individuais por empresas de táxi aéreo (projeto no qual este que vos fala esteve envolvido até os ossos, a propósito), a ideia era criar uma alternativa imediata de modalidade de transporte aéreo para suprir a abrupta interrupção da malha aérea convencional, que fora praticamente paralisada no final de março daquele ano devido à pandemia – a quantidade de decolagens de aeronaves de linha aérea caiu de 70,2mil em janeiro para 4,5mil em abril de 2020, mais de 93% de queda! A intenção era que a ANAC autorizasse às empresas de táxi aéreo a comercialização emergencial e provisória de assentos individuais, e a expectativa era de realizar essas operações por até 90 dias, no máximo, somente para viabilizar a mobilidade aérea naquele momento crítico. Entretanto, a construção da Res.576 consumiu 5 meses de árduo trabalho, numa parceria nunca antes vista entre uma agência reguladora e uma associação empresarial, e o resultado foi uma regulamentação muito mais ampla do que a inicialmente pensada. Porém, quando a Res.576 foi publicada, o contexto da aviação civil já era outro, conforme veremos.

Em agosto de 2020, as decolagens domésticas da linha aérea nacional haviam alcançado a marca de 20,2mil operações/mês, número que ainda colocava a aviação comercial em um patamar 70% inferior a janeiro, mas já era quase cinco vezes maior do que abril, suficiente para, pelo menos, não deixar as pessoas ilhadas – lembrando que ninguém mais viajava a turismo ou a negócios, com ou sem avião disponível: as pessoas só se deslocavam em caso de extrema necessidade. Por outro lado, a aviação geral já estava voando em agosto/setembro de 2020 praticamente no mesmo patamar do mesmo período de 2019, e o táxi aéreo estava super-demandado, em especial nas operações de transporte aeromédico justamente devido à pandemia. Estes dois fatores, aliado a um terceiro que falaremos mais à frente, significaram que, por um lado, a demanda por transporte aéreo regular já estava em um patamar relativamente adequado à oferta das companhias aéreas; e, por outro lado, o táxi aéreo estava bastante ocupado transportando os doentes (de Covid ou não) e seus familiares, médicos, equipamentos e insumos hospitalares e repatriando brasileiros mundo a fora. Neste momento inicial, portanto, as empresas de táxi aéreo não tiveram a necessidade de (e nem a capacidade para) ofertar assentos individuais, a não ser em situações muito especiais, como as “pernas vazias” (voos de resposicionamento em que a aeronave voa somente com sua tripulação).

O terceiro fator de atratividade para a nova operação de venda de assentos individuais, que ainda não estava claro naquele momento inicial, era o fato de a modalidade ser muito mais adequada para suprir demandas sazonais ou específicas, como temporadas de férias e grandes feriados, grandes eventos esportivos (ex. finais de campeonatos de futebol), artísticos (como shows e festivais de música) e profissionais (congressos e feiras), que ainda não ocorriam no Brasil de 2020 e 2021 devido à pandemia. Outro uso da modalidade que veio a se mostrar interessante bem depois do momento de sua criação, foi sua utilização por empresas certificadas pelo RBAC 135 para realizar operações regulares (o que ficou conhecido como “aviação sub-regional”) para avaliar a possibilidade de implantação de uma nova rota regular. As operações de aproveitamento de “pernas vazias”, por sua vez, se popularizaram gradativamente, ganhando forte impulso em momentos de elevada alta no preço das passagens de linha aérea regular, chegando a serem ofertadas a valores bem inferiores do que o preço de balcão da aviação comercial (é o que hoje ocorre, por sinal).

Portanto, hoje, dois anos após a publicação da Res.576, a modalidade da venda de assentos finalmente está se firmando como um nicho específico para os táxis aéreos explorar oportunidades de negócios relacionadas a eventos, além do aperoveitamento de ‘pernas vazias’ com maior eficiência. É nesse contexto operacional que a regulamentação definitiva da modalidade está sendo construída, uma vez que o alcance temporal da Res.576 findou em agosto de 2022 e foi renovado por mais seis meses pela Resolução Nº 687 por mais seis meses, até fevereiro de 2023, quando a regulamentação definitiva deverá ser publicada.

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