‘Do’s and Dont’s’ da criação de um táxi aéreo

Imagem dos sonhos de quem pretende abrir uma empresa de táxi aéreo: a aeronave sendo fretada e os clientes embarcando (e pagando!). Mas para chegar até aí, o caminho é árduo!

Constituir um táxi aéreo pode ser um ótimo ou um péssimo negócio! Como em todo setor (exceção feita aos bancos, que no Brasil são praticamente isentos de risco e extremamente lucrativos), há empresas sustentáveis, que permanecem competitivas por décadas, e outras que nunca veem a cor azul em seus balanços e acabam quebrando. E embora os empresários do setor quase que invariavelmente coloquem a culpa de eventuais fracassos na ANAC, no Governo, na taxa de câmbio ou na concorrência desleal do TACA-táxi aéreo clandestino (o que realmente pode contribuir bastante com a viabilidade do negócio), o fato é que questões internas de gestão e de planejamento estratégico sempre desempenham papel determinante para o sucesso (ou o fracasso) de um empreendimento no segmento de transporte aéreo com aeronaves de até 19 assentos (definição regulatória atual do táxi aéreo).

Em uma empresa de táxi aéreo há diversos fatores muito complexos para serem administrados, como:

  1. Ter receitas em moeda local e parcela significativa das despesas em dólar, inclusive o combustível, que representa cerca de 40% do custo operacional total – lembrando que, além da questão cambial, o preço do combustível (em dólar) também é extremamente volátil, com variações de preços muito radicais;
  2. Ser um negócio ultrarregulado, com um ambiente regulatório difícil de ser gerido e muito oneroso;
  3. Estar sujeito a uma legislação trabalhista muito específica, também complexa e onerosa;
  4. Oferecer um serviço extremamente caro para ser vendido a uma população sem renda suficiente para consumi-lo – ou seja: o mercado efetivo dos serviços de táxi aéreo é bastante restrito;
  5. Não haver nenhum tipo de ajuda governamental para seu fomento; e
  6. Não haver infraestrutura aeroportuária adequada.

Uma empresa de táxi aéreo é intensiva em capital e em tecnologia, além de ser altamente dependente da capacidade técnica de profissionais super qualificados, nem sempre facilmente encontrados no mercado. Não é um negócio para amadores, enfim.

Empreendedores (e eu sou um deles!) gostam de… Empreender! Vender, comprar, construir, contratar, estabelecer parcerias, mandar imprimir o novo cartão de visitas (a melhor parte!); não sobra muito tempo para investir em conhecimento sobre regras contábeis, legislação sanitária ou, no caso de empresas de aviação, regulamentação aeronáutica. Só que esses “detalhes” podem fazer a diferença na viabilidade de um empreendimento, e não são raros os casos de táxis aéreos que morrem antes de nascer porque não se atentaram a determinados aspectos relacionados à regulamentação da ANAC para o fretamento de aeronaves. Muitos dos que iniciam o processo de certificação ficam pelo caminho e tantos outros não sabem o que fazer com a empresa depois de autorizada a operar.

Mas os erros mais comuns que se cometem na constituição de um táxi aéreo, em especial aqueles que geram projetos de certificação interrompidos antes do fim, são sempre muito parecidos. Conhecê-los, portanto, é um bom caminho para mitigá-los, e chegar ao “Nirvana do COA” (obter a autorização operacional da ANAC como empresa de táxi aéreo) em prazo razoável e com muito mais chances de sobrevivência e lucratividade. O que vem a seguir pode não ser a receita para o sucesso (se fosse, eu venderia a peso de ouro!); mas, pelo menos, é um bom guia para não fracassar por motivos banais, comuns a 90% dos projetos malsucedidos. Então, vamos lá!

Tenha um bom plano de negócios para o seu táxi aéreo – e mantenha-se na proa até a certificação, pelo menos

Ao elaborar o plano de negócios do empreendimento (sim, planejamento é fundamental para qualquer negócio!), é importante que o empreendedor invista tempo e energia na obtenção de informações e na construção de análises consistentes sobre as possibilidades regulatórias e mercadológicas para sua futura empresa de táxi aéreo. O que se pretende evitar com isso são situações como, por exemplo, de o empresário descobrir no meio do caminho da certificação que existe demanda por um determinado tipo de operação não contemplada inicialmente (ex.: serviços aeromédicos, operações internacionais etc.) e querer inseri-la(s) nas EO da empresa no meio do processo.

Hoje há diversos modelos de negócios para o táxi aéreo além do fretamento convencional, como o gerenciamento de aeronaves, a venda de assentos, o transporte de cargas leves, as licitações do governo (FUNAI, IBAMA etc.), e muito, muito mais. Nenhum modelo é intrinsicamente bom ou ruim, depende de diversos fatores, e também é possível fazer uma combinação destes. O que NÃO se pode fazer é deixar para pensar nisso DEPOIS de iniciar o processo. Infelizmente, esse é o erro mais comum, e 100% das empresas que não possuem uma estratégia bem definida acabam sucumbindo ou nem terminando o processo de certificação.

Junte todas as peças antes de começar

Isso é um complemento do item anterior, aplicável a outras modificações no meio do processo mesmo sem alterações no plano de negócios. A questão é a seguinte: definidos os nomes de quem serão os ocupantes dos cargos administrativos (gestor responsável, diretor de operações, piloto chefe, diretor de manutenção e diretor de SGSO); das bases de operações e de manutenção, da(s) aeronave(s); dos programas previstos nos manuais etc.; e principalmente das aeronaves escolhidas para compor a frota da empresa, não se deve alterar nada até o processo de certificação terminar.

Certifique-se de que as pessoas, as bases e as aeronaves escolhidas são realmente as melhores opções, e que todos os contratos (de trabalho, de arrendamento de aeronaves, de aluguel de hangares, de prestação de serviços, de reservas de slots em centros de treinamento etc.) estejam assinados, de preferência com cláusulas rescisórias que prevejam multas que desestimulem deserções – e, é claro, só contratar pessoas e empresas idôneas, com boa reputação no mercado. Desnecessário dizer que estes contratos precisam ser redigidos ou verificados por um bom advogado especializado em Direito Aeronáutico.

Se você quer jogar, conheça bem as regras

A certificação de uma empresa de táxi aéreo requer o conhecimento de dezenas de documentos (RBAC’s, IS’s, Portarias, Resoluções, FOP’s, etc.) que sofrem diversas alterações ao longo do tempo. Mais do que isso: a interpretação dessas normas requer acompanhamento constante sobre como a autoridade aeronáutica entende que determinado artigo deva ser aplicado na prática e como ele precisa ser formalizado (qual formulário ou sistema específico deve ser utilizado), quais os prazos para que cada atividade se complete, quais os itens que podem ser flexibilizados (e como fazer isso), e muito, muuuito mais.

Há duas alternativas para lidar com isso: de maneira interna, contratando um profissional que detenha tais conhecimentos, ou com consultoria externa. Contratar um profissional exclusivo REALMENTE bom com a parte regulatória não vai sair barato, então contratar um consultor deve sair muito mais em conta e os riscos da certificação ser mais onerosa e prolongada diminuem drasticamente, mas há um cuidado a ser tomado. Um consultor desatualizado ou mal preparado pode custar muito caro, e infelizmente isso acontece com muita frequência. Então, muito cuidado ao escolher a empresa de consultoria!

Saiba onde está pisando

O mundo da aviação de negócios é muito peculiar. Todo mundo se conhece, pelo menos dentro dos seus subgrupos, que são diversos. Uma empresa que atua na aviação executiva de grandes jatos, por exemplo, forma um esquadrão de elite praticamente à parte. Os táxis que operam no segmento de óleo & gas (aviação offshore), outro grupo bem específico. As empresas do Norte/Amazônia, as de Goiânia principalmente), as de São Paulo capital (Congonhas e Campo de Marte têm outra subdivisão) etc., têm, cada uma, seu pequeno grupo, muito embora todos também se relacionem em alguma medida.

Em um mercado em que todo mundo se conhece, reputação é uma questão fundamental. Embora concorrentes, as empresas do setor também se ajudam mutuamente (por exemplo: uma treinando pilotos da outra, quando esta começa a operar um novo modelo de aeronave). Por isso, uma política comercial agressiva (tentar “roubar” clientes, ou praticar dumping, por exemplo) ou a falta de retribuição quando se obtém um favor, pode atrapalhar muito a operação. Este é um fator importante que geralmente não é muito bem compreendido por quem não é do ramo.

Safety & Compliance

“Safety first” não é um jargão vazio: esta deve ser, de fato, a primeira preocupação de um empresário do setor de aviação. Não bastasse o óbvio (trata-se da vida de pessoas!), o fato é que um acidente pode não só acabar com a empresa como gerar problemas ainda maiores para seus gestores, inclusive implicações criminais. O administrador principal de uma empresa de táxi aéreo pode não saber disso, mas quando ele assume tal posição perante a ANAC, ele também reconhece que tem uma série de responsabilidades operacionais para a manutenção de níveis adequados de segurança operacional (compliance) – são 13 itens de compliance, para ser preciso. No caso de um acidente, o gestor responsável pode ter que prestar contas sobre o cumprimento de todos estes itens.

Time is TOO MUCH money

Se um acidente pode matar uma empresa aérea, uma aeronave parada, sem gerar receita, a aleija. Uma frota composta por aeronaves sem muitos exemplares no Brasil (o que gera dificuldades para encontrar peças de reposição) ou muito antigas; falta de eficiência operacional da empresa aérea ou de manutenção para retornar a aeronave para voo, ou, ainda, a falta de capital de giro para efetuar tarefas de manutenção; e a ineficiência em administração de recursos humanos para recrutar e manter adequadamente treinados seus tripulantes são alguns dos fatores que podem aumentar o tempo que uma aeronave passa sem condições de voo. É muito importante que a empresa esteja bem preparada administrativamente para cuidar de todos os detalhes de gestão operacional.

“Lei de Murphy”

Finalmente, “se alguma coisa pode dar errado, ela certamente dará”: este é o artigo 1º da famosa “lei” – que, na aviação, parece ser fielmente cumprida. Este é um setor em que só os paranoicos sobrevivem, então quem acha que “tudo dá certo no fim das contas” não deveria entrar nesse mercado!

Você tem mais alguma sugestão de” ‘Do’s and Dont’s’ da criação de um táxi aéreo”? Deixe nos comentários!

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